Dar conta - Maria Fernanda Medina Guido

Dar conta

Aprendi desde muito cedo que precisamos ser fortes. Dar conta das coisas, engolir o choro e seguir porque a vida não espera você se recuperar, afinal, a vida não para. E eu repeti essas frases “motivadoras” para mim mesma a vida toda, feito mantras.

 

Mas aí veio a pandemia. E assim como você, eu nunca havia enfrentado uma. E por conta disso e até mesmo por não ter escolhas, enfrentei tudo de cabeça erguida. Dando suporte, esperança e compaixão aos meus pacientes quando muitas vezes dentro de mim, haviam as mesmas dúvidas, os mesmos medos. Vai passar eu dizia com convicção, vai passar. Trabalhei feito gente grande em 2020. E por favor não entendam como reclamação porque trabalhar é uma das coisas que mais gosto de fazer. As pessoas precisaram de suporte como nunca e eu que aprendi a ser forte o tempo inteiro, abracei cada desafio, cada nova carinha que surgia no Zoom.

 

Aí veio o Covid. Só pensei: aqui não. Foram 28 dias de sintomas e eu acreditei o tempo todo que daria tudo certo, e deu, graças a Deus. E aí como a vida não espera a gente se recuperar, voltei rapidamente a tudo e todos, bem esbaforida, diga-se de passagem rs. Depois de ter tido Covid, a suposta pior fase da Pandemia ter passado e tudo ir lentamente retomando o ritmo, com máscara e álcool em gel, eu voltei pro consultório físico, via ainda que a 2 m de distância alguns pacientes, encontrei alguns poucos amigos e familiares depois de tantos meses sozinha em casa, me permiti inclusive a tirar uns dias de férias, e por o pezinho no mar… parecia que a vida estava dando uma trégua… só parecia. Em novembro, comecei a desconfiar que estávamos muito errados.

 

E quando chegou 2021, comecei a sentir o peso de 2020 pra valer. E aí repetir meus mantras não funcionavam mais, eu parecia não estar mais muito a fim de ser tão forte… 2020 havia sido duro, mas 2021 já chegou atropelando tudo. E aí, não sei se foi por optar por devolver minha sala de atendimentos mesmo sabendo que financeiramente era a melhor decisão a ser tomada, não sei se foi um procedimento médico simples que passei, que deu errado e teve desdobramentos terríveis, não sei se foi a falta de apoio de grandes amigos meus quando tomei uma decisão importante em janeiro, não sei se foi perceber teríamos mais um ano terrível de Pandemia, não sei. O fato é que eu “espanei”. Tive uma crise de labirintite feia, que ainda não foi totalmente embora e há quase um mês precisei além de todos os profissionais que já cuidam de mim, recorrer a um psiquiatra. Precisei pela primeira vez na vida de medicações para dar conta. E faço questão de contar isso aqui para reforçar que não, não há nada de errado se você precisa ou precisar também. Foi uma decisão muito acertada. A incerteza que vivemos estava me consumindo e eu não tinha dimensão de quanto. Agora, ganhei fôlego para cuidar de mim novamente e a sensação é muito boa. Estou me refazendo, pouco a pouco, testando estratégias, resgatando hábitos, usando o meu tempo para mim. Precisei fazer muitos ajustes, quanto aos meus horários, meu trabalho. Foi difícil, mas necessário para que eu possa trabalhar com qualidade, cuidar com qualidade do outro e de mim. E assim pretendo seguir, devagar e sempre.

 

Me escancarei toda aqui para que fique claro: Nós não precisamos dar conta de tudo. Não precisamos ser fortes o tempo todo. A vida realmente não para, mas nós podemos parar às vezes sim, para pegar impulso, fôlego. Por favor pare de acreditar nestas mentiras que te contaram. Está tudo bem não estar bem. Ninguém está bem. Quer dizer, pode ser que algumas pessoas ainda estejam em negação e por conta disso acreditem que estejam bem rs, mas quem mora no Brasil, acompanha as notícias, passou grande parte do último ano trancafiado em casa, tem empatia pelo próximo e teme por si e pelos seus, não está bem. Não é só você, eu prometo.

 

Nosso maior cuidado (além de não pegar Covid) é não deixar essa angústia nos sufocar. Por isso, se estiver demais, busque ajuda profissional. Faça Terapia, busque um psiquiatra se for o caso. Para além disso, resgate bons hábitos esquecidos, do passado ou do início da pandemia, use-os sem limites. Música, leitura, escrita, arte, contato com a natureza, troca de afeto, banhos de sol, meditação ou o que quer que funcione para ti. Mas faça coisas para si mesmo. E nunca é demais frisar: use máscaras, se puder fique em casa, acredite na ciência, cuide-se, cuide dos seus e respeite seus limites, sempre que possível. 🙂

Com carinho,

M Fernanda

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