Jogos Olímpicos, autocobrança e autocompaixão
Desde 2012 venho acompanhando os jogos olímpicos com mais afinco. E desde então, de 4 em 4 anos (5 no caso de Tóquio) a TV aqui de casa permanece ligada quase um mês nos canais de esporte, para que eu não perca nada rs
Inclusive venho pensando nos ultimos dias que eu preciso acompanhar mais os nossos atletas pra além das Olimpíadas, mas isso é papo pra outro dia.
Meu pai era um entusiasta do esporte em geral, então sempre tinha um jogo rolando na tv de casa,mas acho que foi minha irmã que manteve essa chama acesa depois que ele se foi. Muito mais do que eu. E nessa minha vasta experiência de 4 Olimpíadas rs consigo perceber como minha percepção dos jogos, dos competidores e resultados muda a cada edição. Em 2021, quando estava começando a estudar e praticar mindfulness e autocompaixão, lembro de ter ficado triste por nossos atletas mas feliz quando a Argentina venceu nosso time de vôlei masculino na disputa pelo terceiro lugar. Feliz por eles porque pra eles isso era um feito que não acontecia desde 1988. Pra nós, seria a 7° medalha, sendo 3 de ouro (se minha pesquisa nao está errada rs). Por favor não me cancelem rs
E agora, talvez inclusive influenciada pelo documentário sobre a ginasta Simone Biles e o documentário que conta as atrocidades vividas pelas ginastas americanas além dos abusos praticados pelo médico da comissão olímpica até 2016, (os dois disponíveis na Netflix) venho prestando atenção em como técnicos e atletas reagem a maus resultados de outros atletas.
Nessa minha pesquisa científica baseada única e exclusivamente em minha percepção, sei que não chegarei a lugar nenhum rs, já que por exemplo, um integrante da comissão feminina de skate chinesa não conseguiu acolher uma menina de 13 anos aos prantos, e ela ficou lá chorando sozinha mas a técnica de ginástica olimpica chinesa acolhia cada ginasta que se apresentava e cometia algum deslize… Mas fico muito feliz em ver técnicos e companheiros que se preocupam e demonstram afeto quando percebem que o atleta precisa. Ainda que ele esteja preparado para níveis de pressão psicológica que nós mortais não estamos rs, e que aparentemente Saúde Mental seja uma pauta levada mais a sério nesse momento, deve ser devastador errar algo que além de ter sido treinado milhares de vezes ao longo dos últimos anos vai te tirar o sonho da medalha olimpica.
Nesse contexto, a autocobrança de alguns atletas brasileiros ao serem derrotados me incomodou. Tem gente que reclamou deles chorando, pelo amor gente, a pessoa acabou de perder a luta que ela esperou sei lá quantos anos, deixa ela chorar. Mas o que me entristeceu foi perceber que para muitos só a medalha de ouro serve. A pesquisadora Mariane Santana fez um vídeo muito interessante contando sobre quando é que os jogos olímpicos passaram a ser sobre alta perfomance, e isso é muito recente. Em seu principio, os jogos prezavam pelo amadorismo, pelo prazer ao esporte. Essa ideia do herói olimpico que vive 24 horas/dia para o esporte além de nova, vai de encontro com o modelo de trabalho capitalista ao qual estamos inseridos. Então, se o atleta fica em 2°, 3°, 4° lugar ainda mais se ele não for de um esporte midiático, talvez as marcas, os patrocinadores, as oportunidades diminuam pra além da decepção consigo mesmo, da frustração de não ter concretizado seus objetivos. Imagina o critico interno desse atleta…
Se tem um atleta brasileiro se torturando em Paris porque é o 2º melhor lutador de judô da sua categoria ao invés de entender que ele é o 2 melhor lutador de judô da sua categoria do mundo pode ter a ver além do que a Mariane explicou, com o fato de que somos uma nação que em grande parte nunca respeitou um “vice campeão”. Uso como exemplo Rubinho Barrichello, justamente por ele ter sido “vice” campeão grande parte do tempo de sua carreira. O cara foi o 2° melhor piloto de fórmula 1 sei lá quantas vezes mas pra gente isso nunca foi o suficiente. É cruel pra vocês também enxergar assim? Pra mim agora é.
Eu sei que para o esporte, os erros, ainda que pequenos, definem seus resultados. Então a perfeição é esperada. E sempre sera assim. Eu sei que tudo isso também é um sintoma, de tempos tão adoecidos. Mas como público, talvez o mais compassivo que possamos fazer por esses atletas é incentiva-los, comemorar seus resultados respeitando sua trajetória e entendendo que eles são humanos e falharão. Pra quem sabe assim eles também possam ser mais compassivos consigo mesmos e entenderem que como um post que vi essa semana, medalha de ouro é ouro, medalha de prata é ouro, medalha de bronze é ouro. Você já pensou, você no seu trabalho, ser o 3° melhor profissional do mundo?